Será que dá para copiar as receitas de felicidade postadas nas redes sociais?
– “Você não vai acreditar quem eu vi essa semana?”, diz Laura à amiga Cláudia.
– “Pois me fale logo, que eu já estou curiosa”, retruca Cláudia.
– “Eu vi a JujuPerfeição, aquela blogueira superfamosa, que tem o corpo supersarado, que vive de dieta e posta imagens incríveis. Quase que eu não a reconhecia. Encontrei com ela e o namorado em um restaurante. Ela estava com uma roupa supernormal, uma maquiagem leve, cabelo bagunçado e, pra piorar a situação, eles estavam tendo uma D.R. (discutindo o relacionamento). E sabe o que eles pediram para comer? Um sanduíche enorme, desses que a gente fica com água na boca e com a barriga cheia só de olhar. Fiquei pensando: nossa, como ela parece uma pessoa normal no mundo offline! E ela come sanduíche? E esse povo briga? As fotos no Instagram são tão perfeitas. Sempre com roupas e maquiagens impecáveis, legenda com juras de amor eterno, viagens para lugares paradisíacos e agora eu encontro ela ali, comendo sanduíche num dos points de uma cidade, que não é Nova Iorque, sentada discutindo com o namorado que fica olhando para o celular enquanto ela fala. Parece que ela habita o mesmo planeta que eu. E eu que achava que blogueiras famosas eram seres quase perfeitos, fiquei um pouco decepcionada, confesso”.
– “Que boba, você, Laura. Pois eu já sabia que, muitas vezes, a vida nas redes sociais é uma vida paralela, pois lá a gente coloca mais aquilo que é bonito e que dá muitas curtidas. Até porque, já parou pra pensar que chato seria se todo mundo ficasse colocando apenas os perrengues que a gente passa”?
– “Ah, Cláudia! Talvez seja por isso que eu não seja famosa e não tenha tantas curtidas. É que eu posto tudo o que eu acho legal. Outro dia, até me falaram que eu postei uma frase que não pegava bem, que parecia aquelas frases de inveja, de estar mandando indireta para alguém, sabe? Falaram-me também que as minhas fotos não são legais, que eu devia postar umas melhores, porque estão sem qualidade. E agora, Cláudia, você me fez pensar que talvez eu esteja tão preocupada em acompanhar a vida da JujuPerfeição, achando que só a dela é perfeita e que a minha não é, que eu estou, literalmente, vivendo a minha apenas copiando o que eu acho legal, mas que nem sempre se encaixa naquilo que eu verdadeiramente sou e acredito. Por isso, não tenho tantas curtidas. Talvez, o que eu precise fazer pra ter minha vida mais atraente é parar de achar que só a vida das blogueiras é que é feliz e perfeita, e passar a olhar a perfeição e a felicidade que há dentro da minha vida. Sabe aquele ditado que diz que a grama do vizinho é sempre mais bonita? Pois é, talvez seja porque estamos olhando mais pro quintal do vizinho do que pro nosso. Acho que eu encontrei a justificativa pra esse ditado”.
Quando o assunto é a receita da felicidade, não há uma fórmula universal para todos, pois, de acordo com a cultura, com a educação que temos, os valores que nos são passados e a maneira como aprendemos a enxergar a nossa vida, é que vamos encontrando os itens que compõem a nossa receita e descobrindo o que nos faz felizes. E, de tempos em tempos, esses itens podem mudar. Afinal, a única coisa que não muda em nossa vida é que tudo muda. Por outro lado, existem alguns itens que estragam qualquer receita de felicidade e um deles é unânime em muitas culturas e civilizações: é a tal famosa “ansiedade de referência”, termo utilizado pelos sociólogos para falar da tendência que nós temos de comparar a nossa vida com a dos nossos amigos, conhecidos e até mesmo de desconhecidos.
“Felicidade é continuar desejando aquilo que já se tem.”, Santo Agostinho
Eu já fui mestre em comparar a minha vida com a de outras pessoas, e o preço que eu paguei foi muito caro. Com a tomada de consciência que venho construindo, hoje, quando percebo que estou fazendo isso, paro e pergunto: como comparar algo que é diferente? Eu não posso ser a JujuPerfeição, até porque eu nem sei se é isso que eu quero ser. O que nós queremos é ter reconhecimento, sermos amados e vistos. Como acreditamos que essas pessoas famosas tenham isso, queremos ser como elas. Mas, se eu parar de focar a vida dela e de ficar me comparando a ela, talvez eu passe a olhar mais pra dentro de mim e me comparar comigo mesma, e descobrir que sim, eu posso ser a melhor versão de mim mesma. E isso não é querer ter a vida da Juju, da Cláudia, da Lara, mas a vida da Lívia na sua melhor versão. E nas palavras de Santo Agostinho, “felicidade é continuar desejando aquilo que já se tem”. E eu desejo continuar desejando a vida que eu já tenho, porque se eu olhar para a minha grama, vou ver o quão bonita ela pode ser se eu dela cuidar.
Sobre Anna Lívia Pacífico
Anna Lívia Pacífico Barros Mota é psicóloga, master trainer em Psicologia Positiva, Terapeuta em EMDR. É proprietária da Pacífico Treinamentos.
Para saber mais sobre a psicóloga Anna Livia Pacifico, leia a entrevista publicada aqui no blog Papo com Cris.
Anna Lívia Pacífico – psicóloga
E-mail: livia.pacifico@outlook.com
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