Transplante de fezes começa a ser feito no Brasil
Pacientes com diarréias causadas pela colite pseudomembranosa são bons candidatos ao tratamento
Novo no Brasil, o transplante de fezes é a única saída para a cura de pacientes que sofrem de colite pseudomembranosa, causadora de diarréias agudas ou crônicas, quando os tratamentos clássicos (metronidazol e vancomicina) falham. Esta doença é bastante frequente e pode provocar quadros graves de toxemia e desidratação, levando, eventualmente, à morte.
O novo método de tratamento foi realizado no país pela primeira vez em fevereiro deste ano, no Hospital Albert Einstein-São Paulo, pelo professor doutor. Arnaldo José Ganc. Ao invés de instilar o material fecal por uma sonda nasoenteral (conforme publicação do New England Journal of Medicine, em janeiro de 2013), utilizou um endoscópio, com o paciente sedado, o que tornou o procedimento menos constrangedor e mais rápido.
Antes de serem introduzidas no paciente, as fezes (de doadores com sorologia negativa para hepatites e Aids) passam por exames parasitológicos, sendo então homogeneizadas e centrifugadas em soro fisiológico. “Injetadas no jejuno, porção do intestino delgado compreendida entre o duodeno e o íleo, recompõem a flora intestinal pela riqueza de bactérias. A diarréia costuma ceder em 80% das vezes logo na primeira infusão”, conta Arnaldo Ganc, endoscopista e ex-presidente da Sociedade Brasileira de Endoscopia Digestiva (SOBED), que já realizou o tratamento em dois pacientes. “Em ambos os casos, foram utilizadas fezes de dois parentes, para melhorar a quantidade e a qualidade das bactérias que irão colonizar o intestino dos pacientes transplantados”, completa Ganc.
A idéia de utilizar o transplante como terapêutica surgiu quando dois pacientes do endoscopista estavam com quadro de diarréia persistente, resistentes ao tratamento clássico. De acordo com o médico, um deles estava internado havia mais de três meses e a leitura da publicação de um trabalho holandês na revista New England de janeiro estimulou-o a oferecer esta terapêutica aos pacientes. “Quando oferecemos essa possibilidade para a solução da colite pseudomembranosa, os pacientes aceitaram de imediato. Hoje em dia os dois já receberam alta e não apresentaram mais qualquer diarréia”, finalizou.
Essa colite é causada pelo Clostridium Difficile, uma bactéria que vive na flora intestinal, mas que não costuma causar problema, quando em equilíbrio natural com as demais bactérias presentes no intestino (mais de 1000 espécies). A ingestão de antibióticos de largo espectro – aqueles que atuam contra várias bactérias – podem causar o quadro. O Clostridium Difficile, resistente aos antibióticos habituais, na ausência das demais bactérias no organismo, prolifera incontrolavelmente provocando graves diarreias. Com o transplante de fezes, as novas bactérias transplantadas exercem forte concorrência ao Clostridium difficile que acaba sucumbindo, permitindo a cura clínica do paciente.